Então na segunda-feira aconteceu. Como já cometei lá no Instagram, recebi um convite que me causou uma mistura estranha de entusiasmo e inquietação: participar da feira do livro da minha cidade como escritora convidada. Escrever já é um ato corajoso, mas falar sobre escrever em público, dividir esse lugar que antes era só meu com outras pessoas, foi quase um ritual de passagem. Não sei exatamente de onde para onde, mas algo em mim mudou.
Passado o gelo inicial, literal e simbólico, aqueles 5º começaram a aquecer os corações. Durante o bate-papo com outros escritores, e depois do bate-papo conversando olho no olho com o público, percebi que muito do que vivi ao longo dos últimos anos ecoava nas palavras dos colegas. As pausas na escrita, os bloqueios, a sensação de não ter nada novo a dizer, a autocensura disfarçada de perfeccionismo. A escrita, quando não respeita nosso ritmo, se torna um dever; e, quando vigiada demais, perde a alma.
O espaço compartilhado na feira foi um lembrete gentil de que não estou sozinha nesse processo. Houve um momento em que um colega disse algo que me atravessou: “Às vezes, a escrita some porque a gente precisa aprender a escutar o silêncio dela.” E ali, no meio do burburinho da feira, me dei conta de como esse silêncio também é parte do ofício.
Não escrevemos apenas com palavras. Escrevemos com tudo aquilo que vivemos enquanto não estamos escrevendo. Com os não-ditos, com os dias atravessados em branco, com a raiva contida, com a alegria surpresa de uma cena cotidiana qualquer. Escrever é transformar esse emaranhado de coisas invisíveis em algo que se pode ler. E isso leva tempo.
Muita gente espera que os sonhos se realizem como quem espera um presente do universo, um pequeno milagre embrulhado em facilidade e glória. Mas a verdade é que as coisas começam a acontecer quando nos dispomos a trabalhar por elas. Quando nos preparamos, dia após dia, mesmo sem garantias, para que, quando a sorte aparecer, ela nos encontre prontos. A sorte, afinal, costuma gostar de quem já está em movimento.
A conversa com os leitores, os olhares curiosos, as perguntas quase sussurradas me devolveram algo que eu nem sabia que tinha perdido: a consciência de que escrever também é um ato de escuta. E mais ainda, de pertencimento. Porque quando uma pessoa se aproxima da sua mesa e diz que se viu no que você escreveu, algo se realinha dentro de você. Como se suas palavras, antes isoladas, agora tivessem casa.
Voltei da feira com um cansaço gostoso, desses que a gente sente depois de um dia inteiro conversando com velhos amigos. Mas mais do que isso, voltei com uma vontade renovada de me sentar diante do papel, não para produzir algo bonito ou útil, mas para me escutar de novo. Com aquela certeza de que sempre irá existir espaço para o diálogo: um jeito de conversar comigo mesma em voz alta, na esperança de que alguém escute e diga: eu também.
Escrever sempre foi um desejo antigo, não ser escritora, mas escrever mesmo, quase um sonho guardado com cuidado. E agora, aos poucos, ele está tomando forma e ganhando espaço no meu dia a dia. Ver esse desejo se transformar em realidade tem sido como acender uma vela em um quarto escuro: pequeno, mas suficiente para iluminar tudo. Afinal o caminho se faz ao caminhar.
E você? Tem conseguido abrir espaço para realizar seus sonhos? Me conta. Quero muito te ouvir. Seus sonhos merecem a sua atenção.
Te abraço com carinho e com o desejo de que a vida seja sempre generosa contigo.
Andressa.
*foto da sessão de autógrafos do livro de Antologias que participei. Muito feliz.